Homossexualidade na Mitologia grega
Mitologia

Homossexualidade na Mitologia grega


     Desde o início da história escrita, centenas de culturas, mitos, folclores e textos sagrados têm incorporado temas homoeróticos e de identidade de gênero. Assim, desde esses tempos mais remotos, muitos mitos narravam estórias envolvendo homossexualidade, bissexualidade ou transgenerismo como símbolo de experiências míticas e/ou sagradas.



     Casais de homem com homem e mulher com mulher eram comuns na Grécia. Havia até mitos para explicar a origem da pederastia, a relação entre homens maduros e jovens: o primeiro dizia que Orfeu, um dos seres da mitologia grega, acabou se apaixonando por adolescentes depois que sua mulher, Eurídice, morreu. Outra lenda afirma que a pederastia começou com o músico Tamíris, que foi seduzido pelo belo Jacinto.



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     A mitologia greco-romana possui diversas narrativas de histórias de amores entre seres do mesmo sexo. Esses mitos têm sido considerados fundamentalmente influentes na literatura ocidental LGBT, sendo constantemente adaptados, republicados e reescritos, e de fato suas figuras são muitas vezes vistas como ícones. O lesbianismo, no entanto, quase não é encontrado nos mitos greco-romanos, embora destaca-se o de Zeus (Artemis) e Calisto.


     O deus patrono dos hermafroditas e travestis é Dionísio, deus gerado na coxa de Zeus, seu pai, depois de sua mãe morrer esmagada pela forma verdadeira de Zeus.Também há deuses considerados patronos do amor entre homossexuais homens, como o amor da deusa Afrodite e os deuses em sua comitiva, tais como Eros, Himeros e Pothos. Eros também faz parte de uma trindade de deuses que desempenharam papéis nas relações homoeróticas, junto com Hércules e Hermes, que concedeu qualidades de beleza e fidelidade, a força e a eloquência, respectivamente, para os amantes do sexo masculino. Na poesia de Safo, Afrodite é identificada como patrona das lésbicas.




     Temos também a história de Tirésias, adivinho cego da Aeona, que conhecia "os dois lados do amor/de Vênus" (tendo mudado de sexo duas vezes e vivido sete anos como mulher); numa história retomada e preservada pelo poeta romano Ovídio em sua Metamorfoses, Júpiter e Juno discutem quem tem mais prazer sexual, o homem ou a mulher, ao que o deus diz que as mulheres sentem maior prazer e Juno discorda, concordando, ambos, em pedir a opinião do adivinho que, dando razão à Júpiter ao afirmar que realmente as mulheres sentem maior prazer sexual que os homens, provoca a ira de Juno, que o cega.



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     Hermafrodito, por sua vez, era filho de Afrodite e Hermes e, por representar a fusão dos dois sexos, não tem gênero definido, sendo um belo exemplo do transgenerismo. Preservado também na mitologia romana, seu relato mais famoso é o da Metamorfoses de Ovídio, em que a náiade Salmacis se apaixona por ele e roga aos deuses que se juntem, misturando-se numa forma intersexual. Alguns autores referem-se que tinha cabelos longos e seios de mulher, e estudiosos notam que, embora seja portador dos dois sexos, ao contrário do seres andróginos (que ainda possuem desejos sexuais) ele é impotente e assexuado, daí seu desprezo por Salmacis.  

     O deus Pã, por sua vez, que vivia nas matas, engajava-se em relacionamentos com ninfas, meninas e também com meninos; sua presença causava pânico, palavra que deriva de seu nome.



A sociedade grega antiga



     Na Grécia antiga, o homossexualismo estava também ligado às tradições militares. A prática era aliada aos bons e leais soldados, a amizade viril entre militares fazia-os mais leais e unidos uns aos outros. Naquela sociedade, composta por uma grande maioria de soldados, acreditava-se que o envolvimento sexual e emotivo entre os militares fazia com que estivessem mais dispostos a dar a vida uns pelos outros, fazendo deles guerreiros ferozes e leais. Portanto, a iniciação com homens experientes poderosos, era fundamental na educação sexual e militar dos soldados.


     Os heróis soldados da Grécia, traziam os mitos com lendas que relacionavam a coragem ao homossexualismo. É o caso de Herácles, o maior herói da mitologia grega. Filho de um incesto de Zeus com a mortal Alcmena, o herói sofreu a vida inteira com a perseguição de Hera, levando-o à loucura, às grandes aventuras, à morte e finalmente, à ascensão ao Olimpo, já como imortal.
     Várias passagens do mito de Herácles trazem a sua força viril, que conta, teria engravidado as cinqüenta filhas de Téspio, rei da Beócia, gerando cinqüenta varões. Mas o amor homossexual ronda o mito, sendo aceito em algumas variações da lenda o seu relacionamento com o sobrinho Iolau, que o ajudou em alguns dos seus trabalhos. Iolau foi presenteado por Herácles com uma esposa, a bela Mégara. Herácles e Iolau tornaram-se símbolo da fidelidade entre casais masculinos, que ao pé da suposta tumba do amante de Herácles  faziam juras e promessas. As Ioléias, jogos ginásticos e eqüestres celebrados em Tebas, reverenciavam o amor de Herácles e Iolau, presenteando os vencedores com armas e vasos de bronze.
Além de Iolau, outros amantes foram atribuídos a Herácles,  Filoctetes, Jasão, Teseu e, o mais recorrente nas lendas, Hilas. 

     Segundo a lenda, na famosa expedição dos Argonautas, símbolo da expansão grega sobre o Mar Negro e às terras ao redor, Herácles foi acompanhado pelo belo Hilas, por quem se apaixonou ardorosamente. Os dois mantiveram-se inseparáveis durante toda a aventura. Seriam separados quando a nave Argos parou em Mísia, na Ásia Menor. Ali, as Naiades, ninfas dos lagos e das fontes, encantaram-se pela beleza reluzente de Hilas.      

     Envolvidas pelo fascínio e pela paixão, elas atraíram o belo jovem até um lago, raptando-o e sumindo com ele. Desesperado, Herácles abandonou a expedição para encontrar o amado. Gritava com a voz embargada pela dor da perda. Foi inútil a procura, Hilas jamais foi visto uma outra vez por qualquer mortal. Restava ao grande Herácles chorar a dor da perda do amado.


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     Aquiles foi considerado o maior guerreiro da mítica Guerra de Tróia. O mais valente e feroz de todos os soldados gregos. Sua força viril contrastava com a vulnerabilidade do calcanhar, única parte do corpo que não era imortal, e com a sua instabilidade emocional. A sua amizade de Pátroclo era um elemento essencial da sua força, imprescindível também, para a força dos soldados gregos. Era esta amizade que se via como o verdadeiro ideal, esta amizade masculina levada ao extremo criou as condições para que o homossexualismo tomasse lugar de honra na sociedade grega. Criados juntos desde a infância, Pátroclo e Aquiles são inseparáveis.      
     Quando Agamenão ofende Aquiles e este abandona os campos de batalha, será a morte de Pátroclo, que o fará voltar, com uma grande sede de vingança. Usando a armadura de Aquiles, Pátroclo é morto por Heitor, o maior guerreiro troiano. O corpo de Pátroclo é deixado nu no campo de batalha, e a armadura de Aquiles roubada. Enlouquecido pela morte do amigo, Aquiles toma-lhe o corpo nu, carregando-o como o troféu da dor. Furioso com a morte do amigo, Aquiles voltará aos campos, matará Heitor e muitos troianos, lutando até a morte.
     
     Ainda em Tróia, Aquiles apaixona-se por Troilo, o mais novo dos príncipes troianos, filho de Príamo. A profecia dizia que, se Troilo chegasse à idade madura, Tróia jamais sucumbiria. Troilo é perseguido pelos gregos. Quando Aquiles depara-se com ele, fica irremediavelmente encantado com a sua beleza, apaixonando-se e oferecendo-lhe o seu amor. Mas Troilo recusa o afeto do herói grego, fugindo para o templo de Apolo.  
     Inconformado com a rejeição, Aquiles executa o príncipe troiano no altar do templo. A execução de Troilo garante a vitória dos gregos sobre os troianos. 


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     Finalmente Teseu, o herói militar mais valente e famoso de Atenas, matador do Minotauro, viveu amores por iguais, tendo nutrido uma paixão por Herácles  a quem ajudou a derrotar os centauros em uma batalha sangrenta. Teseu era amigo inseparável de Pirítoo, com quem teria vivido uma relação de amantes. Juntos, urdiram raptar Perséfone, esposa de Hades, o senhor do mundo subterrâneo, para que Pirítoo a desposasse.  
     Como castigo pela audácia, os deuses aprisionaram os amigos no hades por quatro anos. Teseu seria libertado pelo amigo Herácles  quando tentou libertar Pirítoo, foi impedido por Zeus. Pirítoo despediu-se do amigo, ficando encerrado para sempre no mundo dos mortos, enquanto que Teseu continuou a sua jornada pela terra, como um dos maiores heróis da Grécia antiga.

Os Amores de Apolo


     Apolo tornou-se o deus mais popular de toda a Grécia antiga. Era o deus protetor da arte, da luz, da medicina, entre várias designações. Era tido como o deus da beleza perfeita e ideal perseguida pelos gregos. A prática de esportes era uma tradição na Grécia antiga, tendo Apolo como o deus protetor. Nos ginásios desportivos, os atletas praticavam exercícios totalmente nus. Era na prática da ginástica que muitos romances nasciam entre homens.

     O mito de Apolo descreve intensamente a prática da ginástica com os seus amantes, mostrando uma virilidade que se buscava nos corpos nus dos ginásios. Um dos famosos amores homossexuais do deus foi Ciparisso, filho de Telefo e Jacinta. Apolo venerava a beleza do seu amado, fazendo-se terno e apaixonado.  
     Juntos praticavam a corrida e o arremesso de dardos. Os corpos nus e perfeitos dos amantes corriam ao sol por entre os bosques. Um dia Apolo presenteou o jovem amante com um cervo. Ciparisso apegou-se àquele animal, fazendo-o sagrado. Certa vez, ao jogar os dardos com Apolo, feriu, por acidente, mortalmente o cervo.      
     Ciparisso ficou inconsolável, sendo acometido de uma tristeza profunda. Derramava lágrimas intensas pelo animal sagrado. Na sua infinita dor, pediu ao amante que permitisse as suas lágrimas para sempre, sem jamais esgotar o fluxo. Não podendo negar um pedido ao amante, Apolo transformou-o em uma árvore cuja resina formava gotículas de lágrimas no tronco, nascia o cipreste.


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     O amor homossexual mais famoso de Apolo foi o belo Jacinto. O deus disputou o amor do jovem com Zéfiro, o vento oeste. O deus do vento jamais aceitou ser preterido por Apolo. O deus da arte e o amante costumavam praticar ginásticas e outros jogos. O arremesso de disco era um dos jogos preferidos dos amantes. Numa dessas práticas, Apolo arremessava o disco aos céus com perfeição, sendo observado pelo amado. Quando Jacinto arremessou o disco, Zéfiro, em sinal de vingança, soprou-o na direção do jovem, atingindo-o no rosto, fazendo com que caísse morto sobre a relva, coberto de sangue. Ao ver a fatalidade que acontecera ao amado, Apolo ainda tentou ressuscitá-lo, mas já era tarde, Jacinto fora arrebatado ao hades. O seu belo rosto tinha sido destruído pela tragédia. Desesperado com a morte do amado, Apolo fez nascer do sangue derramado de Jacinto, uma flor púrpura, com cálice em forma de lírio. Em Esparta, cidade de Jacinto, foi instituída uma festa e jogos em seu louvor, as Jacintas,que se realizavam todos os anos.

     Belas, muitas vezes trágicas, outras vezes felizes, as lendas dos amores homossexuais da mitologia grega, tinham alguns pontos em comum; o objeto da paixão de um deus ou herói era de uma beleza rara, na maioria das vezes na idade adolescente. Normalmente a tradição grega permitia que, a partir dos doze anos, os jovens tivessem um homem mais velho como amante. Nas lendas, eles são, com poucas exceções, extremamente novos, mas, essencialmente adolescentes, já com a maturidade sexual do corpo latente, cravada na puberdade, longe da pedofilia. É preciso ter em mente que a fase da adolescência não existia para as culturas antigas, ao rapaz, ao transformar o corpo, ao nascer-lhe os pêlos pubianos e aflorar o órgão genital, era considerado um jovem adulto, assim como as mulheres, transformadas em adultas na primeira menstruação. Atingida esta fase, o jovem adulto era preciso ser iniciado na vida sexual e intelectual da sua cidade. E as lendas legitimavam este costume, só encerrado pela cristianização da civilização helênica




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